- O que significa a alcunha ORGANOCLORADOS? O mercado atual está favorável para a sonoridade da banda?
A letra da canção Princípio Ativo deu origem ao nome da banda. Nela, uma relação entre uma planta e os inseticidas organoclorados, com seu alto poder residual e acumulativo nos organismos, serve de metáfora para descrever uma paixão. Essas propriedades e a persistência são também características do som que produzimos. Quanto mais se ouve, mais se acumula nos corações e mentes. E assim queremos ajudar a combater pragas tais como mesmice, embrutecimento, alienação, apatia e vazio existencial. Portanto, somos os organoclorados que causam efeitos benéficos.
Ao falar de mercado, primeiro é importante diferenciar alguns segmentos. Há o chamado mainstream, o show business, que envolve meios de comunicação de massa, a grande mídia de amplo alcance. Em termos artísticos e musicais, acho até que teríamos alguma receptividade, mas a questão maior é comercial, grana mesmo. Nossa sonoridade transita muito mais no segmento alternativo, independente, underground, com um apelo comercial bem menor, em que a promoção artificial é bem mais escassa. O retorno que temos nas mídias sociais, do público nos shows ao vivo e de rádios, blogs e curadores de playlists do Brasil e do exterior indica que esse segmento tem sido razoavelmente favorável e receptivo a nossa sonoridade.
- O seu som é de difícil identificação. Como você se enxerga na cena: Qual termo seria menos limitante pra classificar o estilo de vocês?
Se por identificação você quer dizer “rotulagem”, realmente não é tão fácil enquadrar no que comumente se procura classificar. Em verdade, acho que o termo mais abrangente é mesmo o pós-punk, pensado como algo que se construiu após o ápice do punk rock. Mas acontece que ao longo do tempo a gente absorve coisas de outras vertentes do rock e até de outros estilos (e nisso temos cabeças muito abertas), sem perder a referência basilar do pós-punk. A depender da bagagem musical e do nível de atenção de quem escuta as músicas da Organoclorados, esse exercício de identificação pode ser bem fascinante.
- “Dreams and Falls” é um álbum magnífico, mas demorei pra entender ele. Os fãs têm falado algo similar para você neste sentido?
Oh, ficamos lisonjeados! Obrigado! Ele é fruto de muito esforço, energia e paixão pelo que fazemos na música. Tirando a barreira natural para quem não domina o inglês, o que é relativamente fácil de transpor com um tradutor digital, eu diria que tem sido mais um agradável motivo de curiosidade. Para nós é bem normal porque temos consciência que a identidade artística que desenvolvemos desde o início provoca estranhamento, curiosidade, questionamento, reflexão... essas coisas que fazem parte do pensamento crítico e do ato de sentir. Às vezes parece complicado, mas basta ouvir, absorver e deixar fluir. Outro ponto importante é a interação com a bagagem de experiências de vida e conhecimento musical de quem ouve. No final das contas, é a parte mais gratificante. Em relação a “Dreams and Falls”, tanto no Brasil quanto no exterior, os fãs retornam das mais variadas formas, demonstrando essa interação, seja com as letras, seja com as harmonias e melodias.
- “Horses on the Streets” é maravilhosa, e pra mim um dos destaques no material. Qual sua real intenção com ela? Qual sua mensagem?
Obrigado! Quando planejamos o álbum, essa música entrou na lista por ser uma das que originalmente foram escritas em inglês. Em termos musicais, a intenção harmônica é minimalista e dançante. A letra trata de paralisia emocional, dependência psicológica e dificuldade de se relacionar no mundo real. Após fechar a composição, elaboramos os arranjos de forma que esses temas fossem embalados numa roupagem que mistura rock, funk e soul. A mensagem é basicamente de desejo de liberdade, mesmo que ela somente seja possível em mundos imaginários.
- Algumas passagens de Rock nacional me chamaram a atenção. Você pesquisou sobre este nicho, para inserir no material?
Sim, o jeito brasileiro de fazer rock, principalmente aquele da década de 1980 e as influências de Raul Seixas sempre transpassam por nossa obra musical, não tem como fugir. A pesquisa é permanente porque mantemos as mentes abertas e atentas. Para esse álbum, assim como para os anteriores, não fizemos pesquisa específicas. Quase todas as músicas haviam sido compostas e com os arranjos básicos definidos e bem ensaiados há anos. Just for Today foi criada entre 2023 e Insecurity foi concluída pouco antes do início das gravações do álbum. Porém, um ponto a ser destacado é que uma parte decisiva para o resultado final foram as próprias sessões de gravação em estúdio, pois ali vieram certas inspirações e ideias para sonoridades timbres.
- “Dreams and Falls” saiu tem algum tempo, então como vem sendo a aceitação dele na imprensa e junto ao público?
Saiu no final de março deste ano. No momento em que respondo essa entrevista, tem menos de quatro meses. Posso dizer que pelos comentários, matérias positivas publicadas em sites e blogs nacionais e internacionais, inclusão em playlists (algumas de curadores do exterior), veiculação em rádios e webradios do Brasil e exterior, a receptividade tem sido muito boa. Ainda mais se considerarmos as limitações que temos para investimento em estratégias de marketing e promoção. E estamos satisfeitos porque somos bem realistas em nossas expectativas, mesmo sabendo que temos uma produção com esse nível de qualidade.
- “Just for Today” e “Insecurity” são outros dois destaques na discografia da banda, mas imagino que não seja senso comum dentro da sua fan base como um todo. Quais canções o público tem abraçado mais?
Realmente, são duas músicas muito impactantes. Just for Today foi uma experiência marcante especialmente para mim porque foi escrita de uma só vez, letra e música. Insecurity veio de uma canção que estava guardada e incompleta, inicialmente composta em português mas que não era totalmente aceita pela banda. Quando tive a ideia de transpor os primeiros versos para o inglês, ficou bem mais fácil compor o restante e ter a aprovação a banda. O público gostou bastante dela, principalmente porque ela saiu como single pouco antes do lançamento do álbum e assim teve um período bom de divulgação. Além dela, acho que Days and Roses e Unreal Searches são as mais abraçadas pelo público até o momento.
- Como se deu o processo de composição e produção deste álbum?
O álbum de estreia que foi lançado em 2001, intitulado “Princípio Ativo”, já trazia uma música em inglês e de lá para cá continuei a de vez em quando escrever letras originalmente em inglês, sem passar pelo português. A banda sempre curtiu e incentivou esse meu lado. Em 2019, uma resenha crítica bem positiva sobre o álbum “Quântico” (2018) que foi publicada na revista digital INK 19 de Los Angeles, blogs e rádios do exterior repercutiram músicas nossas em português e várias entraram em playlists internacionais, o que funcionou com um sinal de que havia um potencial nesse caminho. Durante a seleção das músicas do acervo para as gravações do álbum Saudade da Razão (lançado em 2022), alguns testes nos ensaios preparatórios e as sessões de estúdio foram nos chamando a atenção para possíveis versões em inglês. Mas o projeto ficou na espera porque estávamos promovendo o Saudade da Razão. Algumas canções compostas em inglês estavam guardadas e recuperamos para ensaiar melhor. Nesse período, eu compus Just for Today e me dediquei a pesquisar e melhorar as traduções e versões para o inglês, experimentar entonações e significados, no que contei com a ajuda dos professores e amigos Maria Eunice Bahia e Matthew Carmo.
Ao retornarmos ao estúdio em 2023-2024, para gravar novas músicas para um novo álbum em português, logo percebemos a chance e o desafio de também gravar em inglês. Fizemos um aditivo na contratação do estúdio e expandimos a empreitada para um número maior de músicas e as versões. Foram muitas sessões de estúdio, desde as guias para definir andamentos e estruturas, passando pela inserção das linhas de base de bateria, baixo e guitarra, arranjos de licks, arpejos, solos e timbres de guitarras, arranjos e timbres de teclados e piano, tomadas de vozes, coros e efeitos. Na reta final, acompanhamos de perto o processo de de mixagem e edição, atentos a detalhes, opções de timbres e sempre abertos ao experimentalismo. Junto com o estúdio, resolvemos aplicar uma masterização específica para as músicas em inglês, diferenciando-as de maneira sutil daquela aplicada às faixas em português que ainda virão no álbum inédito em português e também das versões originais que estão no Saudade da Razão. Delineado o conceito do álbum, o objetivo da banda era traduzí-lo, o que significa buscar uma síntese dos ciclos de alternância entre peso e melodia, sonho e colapso, realização e decepção. Nessa jornada, testamos ao extremo nossa capacidade de unir melancolia e energia dançante,
explorando sonoridades vintage e texturas contemporâneas, sem perder o eixo de ligação com os álbuns anteriores.
- Um novo álbum já está nos planos? Esperamos imensamente que sim...
Sim! Temos material gravado e em fase final de edição, mixagem e masterização (que também estamos acompanhando bem de perto) para um álbum inédito, ainda sem título nem estimativa de data para lançamento. As músicas foram selecionadas depois de um conceito bem estabelecido e o processo de gravação trouxe novidades bem interessantes. Outra produção que está nos planos é de um conjunto de versões para o espanhol, talvez até para formar um EP, visando a demonstrar nossa gratidão ao público da América Latina e da Espanha que tem sido muito carinhoso e bem receptivo em relação ao nosso som.
- Algo ficou a ser dito? Obrigado pelo tempo ao Sub Discos Blog...
Em nome da Organoclorados, eu, Artur W, gostaria de agradecer a oportunidade de estar aqui conversando com vocês sobre o nosso trabalho, pois é uma maneira importante de nos aproximar do público. Afinal, detalhes dos processos que envolvem a criação e a produção musical também são valiosos e uma fonte inesgotável de boas conversas. As respostas que apresentei aqui passaram pelo crivo dos integrantes da banda, para sugestões e inserções, para que correspondessem ao que a banda como um todo pensa e reflete. O público é a energia que nos move. A você que está lendo essa entrevista, tenha certeza de que a Organoclorados produz sempre com muita paixão, sinceridade e o compromisso de entregar o melhor que podemos criar. Siga-nos nas plataformas digitais de streaming. Inscreva-se em nosso canal no YouYube. Estamos nas mídias sociais: Instagram, Facebook, Tik Tok e Threads. Força sempre. André G – baixo; Artur W – guitarras, violões e voz; Joir Rocha – bateria e percussão; Roger Silva – teclados e backing-vocais.
@organoclorados
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